domingo, 29 de novembro de 2009

Rodrigo Leão

Lá fora chovia copiosamente. Era sábado, a primeira noite de um fim-de-semana prolongado. Nos écrans de televisão estava a dar o sporting-benfica.

Fomos mais de três mil que viramos costas a tudo, ao futebol, às mini-férias de Dezembro, ao aconchego de nossa casa. No dia em que soube que eles vinham ao Porto, tratei de vida. Foram três notas de vinte aplicados em prenda à patroa. Nem que chovessem canivetes, pensava eu, longe de saber que não foram canivetes mas penicos dela. “Vida tão estranha”, canta a Ana. “Como uma corda tensa vivo o dia-a-dia” e são estas noites de magia que nos aliviam a alma. E que noite, meus caros amigos e amigas, que noite!

Era a primeira vez que o Coliseu se enchia para os receber. Francamente, dei por mim a pensar que estava a sonhar. Como um Porto Vintage, um jantar no D.O.C. ou uma escapadela no Alentejo profundo, imaginem um concerto que juntou tudo o que de bom se faz em Portugal. Agora que estão a imaginar e o deslumbramento vos invade, eis encontrada a definição para este concerto de Rodrigo Leão e os Cinema Ensemble nesta noite de verdadeira magia.

Nas suas faces, perante um Coliseu pelas bordas, via-se o nervoso miudinho. Todos os artistas, incluindo muitos dos internacionais que nos visitam, sabem que este público é especial. Exigente e duro mas de uma entrega genuinamente total quando perante a excelência. E isso pesa, se pesa, na cabeça de qualquer artista. Foi aqui que vi a Beth Gibbons chorar como uma menina tal o ambiente electrizante com que o Porto recebeu os Portishead e a surpresa estampada no rosto de Lila Downs na Casa da Música mas também um certo distanciamento de boa parte da assistência quando os Feist por cá passaram e que dizer da loucura instalada aquando do concerto dos Placebo? Somos assim, ou tudo ou nada.

Esta foi a noite da consagração de Rodrigo Leão e dos Cinema Ensamble no Porto. Merecida, mais do que merecida. O Rodrigo Leão é o maior génio vivo da música portuguesa e só se espanta quem não conhece. Mas esta foi uma noite especial, muito especial para a Ana. A sua voz é divina. A forma como começou nervosa, quiçá receosa perante tantos e tantos e se superou por via de uma entrega total e absoluta, numa comunhão perfeita com os músicos, marcou-me profundamente e, tenho a certeza, a todos os presentes. Foi uma dádiva.

A Ana Vieira entrou, a partir de hoje, na “minha” galeria das mais notáveis vozes femininas. Mas o que estou eu a dizer? Ó injustiça! Qual Beth Gibbons, qual Lila Downs, qual PJ Harvey ou Laura Veirs ou Yael Naim? Lhasa de Sela? Joanna Newsom? Little Annie ou Teresa Salgueiro? Qual quê? A Ana Vieira é “A Voz”.

O seu canto, em português (perfeito), em francês (maravilhoso), em castelhano (castiço), em inglês (competente), etc, etc, etc, supera qualquer outra.

Ela ali, sozinha perante o holofote de luz, com o microfone na mão direita enquanto a esquerda ajuda a amparar o corpo no tripé, a sentir os instrumentos e a embalar o público num êxtase completo cantando “a minha alma chama por ti” e, no fim, o calor das palmas, dos gritos de “bravo” e ela, a sorrir envergonhada como uma criança e com as mãos abertas com os dedos esticados, muito hirtos, como dez pequenas barras de ferro, fugindo da nossa vista. Ela fugiu, refugiou-se atrás da cortina preta enquanto o Coliseu vinha abaixo numa enxurrada de palmas e palmas e palmas. Ela fugiu talvez querendo manter escondido este que foi, até hoje, o maior “Segredo” da nossa música e eu “Em vão procuro as palavras” que expliquem o que hoje aconteceu e só “peço mais uma vez ao tempo” que me permita voltar a assistir a uma noite assim.

O Porto é assim, grato perante o sublime, insistiu incessantemente para um regresso ao palco e no que foi retribuído. Mas não chegou e, uma vez mais, quando o Coliseu já tremia, outro regresso com repetição de temas fruto, julgo eu, da surpresa, outros não estavam preparados. São assim as noites de apoteose. São assim as noites mágicas.




2 comentários:

Anónimo disse...

Porto de asas cortadas

Publicado por PauloMorais em 26 Novembro, 2009

“É urgente transferir para a esfera regional a propriedade e a gestão do Aeroporto Francisco Sá Carneiro. Só independente, o Aeroporto do Porto sobreviverá. Integrado na rede nacional da ANA, será apenas uma filial do Novo Aeroporto Internacional de Lisboa, um apeadeiro periférico de Alcochete.”
JN.

Anónimo disse...

Air Race: Comerciantes do Porto apelam a boicote aos patrocinadores

ASSOCIAÇÃO PREOCUPADA COM EVENTUAL DESLOCALIZAÇÃO DA PROVA PARA LISBOA



A Associação dos Comerciantes do Porto apelou ao boicote aos produtos das empresas TMN, Galp e EDP, que patrocinam o Red Bull Air Race, como forma de protesto contra a eventual deslocalização do evento para Lisboa.

"São muitos os prejuízos diretos e indiretos que a deslocalização do Red Bull Air Race trará para o nosso comércio, para os nossos comerciantes", declarou o presidente da Associação dos Comerciantes do Porto (ACP).

Em comunicado, Nuno Camilo diz que "não se compreende como é que os grandes patrocinadores do evento, TMN, EDP e Galp, têm nos seus conselhos de administração elementos nomeados pelo Governo e não se ouvem vozes de preocupação referentes ao comércio nesta região".

"A taxa de desemprego no distrito do Porto é uma das mais elevadas do país, mas mesmo assim não existe preocupação do poder central em promover a região", criticou.

É neste contexto que a ACP apela "ao boicote no consumo dos produtos da TMN, Galp e EDP", acrescentando que "só falta tirarem o vinho do Porto e o Futebol Clube do Porto à região do norte".

A ACP recorda que "as corridas Red Bull Air Race são uma excelente forma de promoção turística da região e uma verdadeira oportunidade para dinamizar e fortalecer o comércio tradicional".
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